Redações nota 1000 de alunos do PENSI no Enem 2013.
O MEC liberou, nesta quarta-feira (2), o texto corrigido das redações do Enem 2013. O espelho da prova pode ser conferido na página do exame no site do…
O gonçalense Renan Ferreirinha, o paulistano Victor Domene e o carioca Luiz Fernando Leal têm algo em comum além da origem humilde. Eles foram aprovados com bolsa para universidades americanas em que até a elite brasileira tem dificuldade para entrar. Renan está em Harvard desde agosto. Victor recebeu a aceitação em Princeton, Harvard, Columbia, Yale e Duke. Luiz passou para os institutos de tecnologia da Florida e Illinois. Ambos ainda aguardam respostas de outras universidades para decidir onde vão estudar.
Filho de uma recepcionista e um professor de educação física, Luiz Fernando, de 20 anos, recebeu bolsa desde cedo nas escolas onde o pai trabalhava. Mas confessa que começou a se dedicar aos estudos só aos 13 anos, quando descobriu o sonho de ser piloto de caça. Ficou fora do ensino tradicional por dois anos estudando para a Escola Preparatória de Cadetes do Ar (EpCar).
— Meu nível de matemática era baixo e tinha problemas em português. Em 2009, fiz um cursinho com bolsa de 100%, pois viram que eu tinha potencial mas não poderia pagar. Passava de domingo a domingo estudando pelo menos umas 10 horas por dia — conta ele, que completou o ensino médio ano passado no Cefet, onde está terminando o técnico em eletrônica.
Da decepção à realização
Hoje, tem uma bolsa de iniciação científica no Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas. Antes disso, venceu o desafio de passar na EpCar. Mas teve que encarar outro obstáculo: descobriu uma miopia que o impedia de realizar seu sonho de ser piloto. “Foi algo devastador”, segundo ele. Após passar por três oftalmologistas, acreditou no diagnóstico de que não era apto à cirurgia:
— Mesmo que eu pudesse, não teria como pagar R$ 5 mil.
Não tinha condições nem de arcar com as despesas de um cursinho de inglês básico, que seu pai conseguiu pagar apenas durante um ano. Aí ele decidiu aprender o idioma na marra, sozinho. Morando de aluguel no Méier, depois de se mudar de Pilares com a mãe e com o irmão, Luiz Fernando passou a estudar pela internet, com gramáticas on-line. Também usou rádio para ouvir notícias em inglês, e seriados americanos com legendas na língua original. No ônibus ou no metrô, lia livros no idioma:
— Tomei a coragem de aprender inglês em um ano e meio em nível de aluno de ensino médio americano. Foi um trabalho autodidata e intenso. Batalhei bastante e tive que abdicar de muita coisa para algo incerto. Acordava às 5h, ligava o aplicativo de celular e ficava escutando notícias da CNN. Nos primeiros meses, entendia muito pouco, mas pegava o contexto. No horário do almoço, ia para um ponto do Cefet em que há wi-fi e ficava escutando rádio em inglês. À noite ficava em casa até meia noite estudando.
Tudo isso para aplicar para universidades americanas, seu novo sonho. Chegou a 2013 com um inglês que considerava ainda não muito bom. Descobriu o programa Oportunidades Acadêmicas, que dá apoio financeiro a estudantes que se destaquem mas não tem condições financeiras. Fez a prova de inglês do programa por duas vezes e passou na segunda. No TOEFL, foi aprovado de primeira.
— Já ouvia falar em aplicar para universidades americanas, mas achava que era coisa de americano muito rico ou de filho de empresário brasileiro. Quando vi que havia estudantes mais humildes como eu, comecei a entender o processo de estudar fora. Agora, quero ir para lá e trazer esse conhecimento para o Brasil de volta. Só isso me deixa arrepiado.
Renan Ferreirinha, de 19 anos, já está lá fora desde agosto. Do bairro de Mutuá, em São Gonçalo, para chegar a Harvard, no estado de Massachusetts, ele precisou estudar muito. Depois da infância jogando bola na rua e brincando de bolinha de gude e pião, o garoto passou para o Colégio Militar, que lhe deu a base acadêmica necessária. O inglês aprendeu em um cursinho local. E ensinou a língua também a crianças carentes do Complexo do Lins, como parte de um trabalho voluntário:
— No fundo, o inglês era uma ferramenta pela qual ensinávamos conceitos básicos de cidadania para crianças que dificilmente teriam outra oportunidade parecida na vida.
Renan teve. Filho de professores, aprendeu a passar adiante o conhecimento. Durante um recesso nas atividades acadêmicas na primavera americana, ele viajou para o Peru com amigos católicos de Harvard para realizar trabalhos voluntários como ajudar na construção de casas em favelas e visitas a orfanatos. O voluntariado, inclusive, foi um diferencial para ser aceito na universidade.
Estudando Economia e Ciências Políticas, ele está aprendendo bem mais que isso. Tem aulas de diferentes áreas, como empreendedorismo e inovação social, cidades e globalização, e política e dilemas morais. Junto com amigos, criou o site www.oformigueiro.org, uma plataforma de financiamento coletivo (crowdfunding) completamente voltada à educação. Em seis meses, já concluíram quatro projetos, arrecadando mais de R$ 6 mil reais de quase 100 doadores e ajudando diretamente 210 crianças.
— A experiência está sendo muito enriquecedora. Cada dia é uma oportunidade magnífica e até então inimaginável. Já fui a aulas de professores Nobels, palestras de presidentes e encontros pessoais com ex-alunos incríveis. Depois de me formar, quero trabalhar com educação, especialmente educação pública, no Brasil. Estudei por sete anos numa escola pública de ponta e sonho propiciar a outros jovens oportunidades similares ou até melhores que as que eu tive.
Programa oferece chances
O EducationUSA, órgão oficial para estudo nos Estados Unidos do Departamento de Estado norte-americano, oferece a jovens como Renan e Luiz Fernando a chance de aplicar para universidades no país. Os principais pré-requisitos para ser selecionado no programa Oportunidades Acadêmicas, que prepara e oferece bolsa para o processo de candidatura, são comprovação de baixa renda, nível de inglês avançado, boas notas no histórico acadêmico e atividades extracurriculares e comunitárias, que demonstrem liderança, motivação e iniciativa.
— O programa é para um público específico, que teria todas as condições de pleitear uma bolsa nos Estados Unidos com a exceção do dinheiro para pagar o processo de candidatura, que custa até US$ 3 mil e envolve vários gastos, como tradução da documentação e viagem para a prova. Possibilitamos que esses alunos possam competir com aqueles que têm condição financeira — resume Bianca Manena, coordenadora do escritório do EducationUSA na PUC-Rio.
Victor Domene, de 17 anos, tem esse perfil. Filho de um ex-jornaleiro e uma dona de casa, ele foi bolsista do Colégio Bandeirantes, em São Paulo, onde se destacou como aluno. Além de ter passado no vestibular para Engenharia Elétrica para USP, UFRJ e ITA, ele recebeu aprovação em Princeton, Harvard, Columbia, Yale e Duke.
— Estou negociando com as universidades para viajar aos Estados Unidos este mês para conhecer os campi e poder fazer uma escolha mais consciente. Todas as universidades que apliquei são incríveis, e vai ser muito difícil escolher — prevê Victor.
Fonte: O Globo